quarta-feira, 31 de março de 2010

O primeiro gole a caminho do vício

Lembro-me perfeitamente de uma cena em especial: eu deitada na cama chorando com a triste história de um menino que teve de deixar amigos e a primeira namorada para trás por conta da vida de exilado do pai.
Nessa idade eu nada entendia sobre ditadura e censura aos meios de comunicação, afinal era uma criança recém alfabetizada, mas me recordo de todo o drama sofrido pela família de Marcão, filho de um jornalista que foi obrigado a sair do Brasil, pois era caçado pelos policiais malvados. Foi esse o primeiro e mais significante livro que lí.

Meninos sem pátria, fazia parte de uma coleção infantojuvenil e foi ele o responsável por uma paixão, talvez uma patologia que me segue até hoje, a literatura.

Lembrei-me de escrever sobre essa doce passagem de minha infância, porque depois de todos os anos e das centenas ou milhares de livros que já estiveram em minhas mãos, esse não foi de menor importância.

Hoje, depois de muitas tentativas, consegui recuperar esse tesouro que havia deixado lá na memória.

Algumas pessoas dizem que sou doente e que essa minha relação de amor com os livros não é normal, talvez se tivéssemos uma cultura um pouco mais literária eu seria mais compreendida, de qualquer forma eu não abro mão de ir atrás, de me perder em livrarias e sebos, o que não faz de mim uma intelectual radical, ou uma nerd sem amigos.

Voltando ao precursor desse facínio pelos livros, ele jamais saiu de minha cabeça e de meu desejo de consumo nostálgico. Claro, afinal é muito melhor amar o que nos pertence, e para mim não basta lê-los, é preciso tê-los. Sendo assim, hoje sozinha e adiantada pra um encontro, resolvi para não me irritar em ficar esperando, fazer um dos meus programas favoritos e entrei em um sebo.

Depois de correr os olhos por mais de quarenta minutos em todo o acervo de literatura estrangeira, nacional, teatro e história, alguma coisa me fez lembrar dele e não resisti.

Uma sequência de fatos ganharam vida vindos da minha infância ao olhar para a capa do livrinho de poucas páginas.

Comprei o livro, sai da loja lendo-o e me mantive assim até que a pessoa a quem eu estava esperando e de quem por alguns minutos esqueci, chegasse.

Obviamente que hoje, depois de mais de quinze anos, o livro me pareceu mais um conto do que uma grande obra, mas a sensação de reencontrar aquelas personagens com as quais criei vínculos tão fortes na infância, foi indiscritível.

Para muitos ou quase todos isso pode parecer uma bobagem sem fim. Para mim essa foi uma das coisas que mais me manteve ligada à época em que eu aproveitava uma oportunidade de ir com minha mãe ao centro comercial de minha cidade para poder devorar os livros da biblioteca pública.

Poucos adoradores de livros vão se lembrar de qual foi o primeiro de sua vida, eu tenho esse privilégio e com ele eu resgato memórias de uma fase boa, talvez a melhor para qualquer pessoa.

Agora eu tenho mais um em minha prateleira e embora seja um dos mais modestos vai ser sempre ELE.

Um comentário:

  1. Me enche de prazer ver seu blog sempre cheio de grandes postagens! Parabéns!

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